quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Inconvergente

Faculdades mentais alteradas
Não sei se lembro sei que esqueço
Há sempre um rosto atrás do espelho
Não conheço o meu

Não conheço o meu

Não conheço o meu impulso pra nada
As manchetes entre as quais desapareço
Apressado em pensar em coisas vagas

Não conheço o seu

Não entendo o seu fetiche por respostas
suas apostas em causas perdidas
Nunca li o manual que te explica
Não pretendo o seu

Não pretendo o seu

Não pretendo o seu sorriso ou simpatia
Me alegro do desdém que nada compra
Você não sabe o que procuro
porque você já sabe tudo
Não percebo o nosso

Não percebo o nosso

Não percebo o nosso ar superior
Ou se percebo ignoro
O nosso "Pai" pariu um homem morto

Não carrego a sua cruz...

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

O acaso e outro caso

Dia desses, andando pelo Largo da Carioca, um sujeito gritou no meu ouvido de repente: "Jesus Cristo é o senhor!" Olhei pra ele com ar preocupado, respondi que eu não era nada e o aconselhei, não tão educadamente, que fosse fuder a vida de outro. Aqueles três velhinhos não fizeram isso com aquele moleque pobre lá na manjedoura? Chamaram-no de Jesus, nem esperaram que ele pudesse responder por si e deu no que deu, o garoto entrou na porrada e foi crucificado. Mas comigo não!

Falando nisso, lembrei de uma história linda sobre destino, coisa na qual nunca acreditei - como aliás não acredito em muitas coisas - mas aconteceu com pessoas muito próximas a mim, um homem e uma mulher a quem chamarei por Norato e Maria Rita, respectivamente, para que sua privacidade permaneça. Pois bem, acontece que eu saía muito com os dois, embora nunca houvesse coincidido de sairmos os três juntos, e falo de muito tempo, de anos. Também nunca lembrei de comentar sobre um com o outro e nunca pensei que, caminhos cruzados, alguma coisa pudesse haver entre os dois, até porque Maria era mais corujona, gostava da noite e de boates, enquanto Noratão era mais de acordar cedo, curtir uma feijoada, um churrasco, uma cervejinha à luz do sol e longe da clausura dessas boates.

Certa vez, totalmente por acaso, combinei alguma coisa que já não lembro o que era, na qual os dois finalmente se encontrariam. Ocorreu que por igual acaso o encontro fora adiado, pois Maria ficara de cama por conta de alguma virose ou uma grande ressaca. Perdoem minha memória falha, acontece que além de outros motivos, não sou do tipo "narrador onisciente", embora o pareça. Vale a pena observar que Mariazinha era possuidora de seios antigravitacionais, que venciam com bravura a lei da gravidade. Não eram grandes, antes de mais nada, eram seios bravos, que apontavam pra cima com delicadeza e determinação. Fosse um poeta, eu diria que almejavam transcender o corpo e alcançar a graça divina...mas retomemos a bela narrativa que pretendo concluir.

A verdade é que toda história com final feliz deve ter um dedo do destino, do acaso, as pessoas gostam de acreditar que existem essas coisas, quase sempre pra tirar um pouco do peso de alguma merda de responsabilidade delas. Neste caso é diferente: eles nunca tomaram conhecimento um do outro. Mas posso dizer, pro relato não perder o charme, que ambos foram muito felizes nos bons momentos da vida e sofreram nos ruins. Maria Rita acabou casando e vai morrer. Norato já morreu, acidentado. Alguns dizem que é o destino, outros, que a vida tem dessas coisas.

...

eu não falo nada.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

O amor ( a velha história )

Eu quase morri de rir
quando percebi
que fracassara novamente

Eu quase toquei o céu
Eu quase toquei o céu
quando tentei tocar o céu

Às vezes acho que sim
Às vezes acho que não
e
outras vezes eu não sei
outras vezes
eu não sei

A velha história

Nunca estivemos tão certos das nossas dúvidas
É nisso que gostaríamos de acreditar
Pouco sei sobre o que esqueci, é verdade
como se fossem lembranças ruins
como segredos secretos demais.

Tampouco sabemos sobre os nossos futuros gestos

Nem sempre os planos são infalíveis.
Quase nunca são.
Sei que o que pesa nos meus gestos é você
e é tão leve que quase não posso suportar...teu ser
tão aéreo,
teus gestos de uma tonelada sobre mim.

Já não sei onde piso
Já não sei se flutuo
Já não quero discutir se estamos vivos
ou não

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

A reconquista: portas abertas.

- Sai daqui agora.
- Por favor, não faz isso comigo! Juro que nunca mais vai acontecer.
- Você é nojenta. Sai daqui.
- Não! Não! Isso não vai se repetir, meu bem, eu juro! Não me mande embora!

De nada adiantava, ele permanecia impassível, olhando para algum ponto fixo no chão, a porta aberta          enquanto a mulher choramingava, implorava um perdão que não parecia possível, tanto mais levando em conta que as coisas não andavam bem havia algum tempo. Há tempos que um não via o outro sem que acontecesse uma indiferença recíproca, embora ele soubesse ainda existir amor. Um amor não mais arrebatador, é verdade. Onde estaria então? Estamos há tanto tempo juntos, pensava. Será que todo esse tempo foi desperdiçado? Não. Sabia que era apenas uma questão de se esforçar um pouco mais - como nos velhos tempos.

Naquela manhã acordou amando-a e enquanto a observava dormir, sorria babacamente. Vestiu seu uniforme e saiu pra trabalhar, não sem antes pousar um demorado beijo na testa da bela adormecida e refletir que desde quando decidiram morar juntos a coisa começou a dar errado e pensou ainda que todos os dias são bons até o inevitável momento de levantar; depois disso é um gotejar de horas, minutos e segundos e formalidades e obrigações a serem cumpridas. Compridas. 
- Tem gente que diz que o mundo não tem nada pra oferecer, mas eu comparo o mundo com um bolo. Um bolo cheio de cobertura e confeitos, mas quando você corta, só tem terra, é pura ilusão, irmãos! Mas EU SEI, senhores, EU SEI, que Jesus tem um pão fresquinho pra oferecer a vocês e sei que TODOS VOCÊS estão comendo esse pão agora, passando uma manteiga do céu...

Lembrou-se desta pregação que ouvira certa vez em um trem lotado, como agora. Que bom que proibiram essa merda. Teve vontade de rir e de desmaiar, mas a vontade de amar o havia tomado por completo.

Naquela noite, recusou todos os convites a bares e puteiros que tanto adorava saindo do trabalho direto pro bar do Alvarenga, cheio de dentes à mostra. Pediu uma cerveja escura, uma dose de catuaba, dois ovos cozidos e um pacote de amendoim. Tomou tudo entre piadas da turma do bar, os olhos bem abertos como se estivesse louco e foi embora sem maiores delongas "como nos velhos tempos". Pegou o Santa Cruz direto pra Central que, pelo horário, já estava vazio, de modo que pôde escolher um lugar ao acaso e sentar-se pensando que estava com sorte, pois o trem não só tinha ar refrigerado, como estava funcionando. Sacou um volume do Trópico de Câncer pra se distrair, mas sua cabeça já estava dentro de casa. Não percebeu a voz anunciando que aquele trem não faria parada na estação de São Francisco Xavier, e quando deu por si já estava em São Cristóvão. Fosse outro momento, teria resmungado e carregado um estado de tensão até o dia seguinte, mas não hoje. Desceu em São Cristóvão mesmo e esperou o próximo trem na direção oposta.

Ao entrar em casa, sorrateiro qual ladrão, surpreendeu a mulher de pé na cozinha, mastigando alguma coisa, de costas pra ele e fez um barullhinho com a chave só pra ela não se assustar demais. Abraçou-a por trás, com o pau levemente teso, mordiscou-lhe a nuca do jeito que ela gostava. Ainda um pouco surpresa, a mulher ofereceu o rosto, que foi prontamente beijado. Sentiu o pênis se avolumando pressionado contra seu corpo e as mãos afastando com delicadeza suas pernas e massageando sua buceta por cima da calcinha velha que usava. Deixou escapar um gemido baixinho. Ele então afastou a calcinha toda babada  de tesão com o dedo indicador ao mesmo tempo que introduzia o médio. Fizeram amor ali mesmo mas foram continuar no quarto.

As coisas não podiam estar melhores, pensava no instante em que a mulher, empolgada com tudo isso, decidiu ousar, pedindo, transtornada e tresloucada: Come meu cu. O cara se emocionou. Mesmo após tanto tempo juntos, após várias tentativas, ela jamais cedera a tal capricho e agora estava lá, repetindo o pedido: vai, come meu, come. Refeito desta surpresa, incrivelmente excitado, introduziu lentamente a cabeça do pau no cu da mulher; ela gemia alto AI AI AAAAI...e ele pensava que a estava machucando e parava, ao passo que ela pedia METE NÃO PARA METE e ele metia no buraco apertado de forma cada vez mais cadenciada até que começou a sentir um forte cheiro de merda. Sua reação ao ver o pau todo cagado foi, logo após a ânsia de vômito, jogar a mulher pra fora da cama com um tapa acompanhado de um sonoro PORRA! Ela tentou dizer alguma coisa, sentada no chão, mas tomou um chute na lateral da coxa SAIDAMINHAFRENTECARALHO 

Ele olhou pro lençol sujo e foi lavar-se. Voltou pra sala abrindo a porta e fez a mulher sair toda cagada.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Conto de fodas

Leonardo nasceu fudido,
por um rabo de saia se fudeu Bentinho
e por caminho semelhante
o jovem Sorel se fudeu por amor e olho-grande

Dom Quixote se fudeu já velho
Emma Bovary fudeu de tédio
por culpa do acaso quem se fudeu foi Édipo

Romeu se fudeu na juventude
Mersault também - por seu desbunde-
Jack Barnes se fudeu durante a guerra
Henry Chinasky só se fode e não se conserta

Isto é uma obra de ficção.

mas

qualquer semelhança com a realidade
corresponde de fato a uma possibilidade,
um pouco da vida é isso:

Todos nos fudemos cedo ou tarde.