sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Poema-passagem-para-o-inferno

Ele tem as bochechas rosadinhas
é cheio de afetações e "nojinhos."
Nunca assistiu um filme pornô!
e gosta de se distrair
indo a teatros e cinemas cult.

Abomina a ressaca que se segue à mundana distração de um churrasco sem carne.

Ora, ele é um intelectual,
bem preparado para a vida profissional
embora sempre com uma gripezinha,
alergia ou tédio...pelo menos
ele sempre terá dinheiro para
pagar o analista que finge que o escuta
mas nunca
vai comer uma puta.

sábado, 29 de outubro de 2011

Trajetória

Querendo
dormir
nos
braços
da
que
da
no
ar

Eu
pesado
em
rota
de
colisão
pra
sempre
sumindo
con
sumido
pelo
ar

O universo
sou eu
no
tempo-espaço
comum
a
nós
.
.
.

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

As escolhas que conquistamos

...e assim nos conhecemos.
Depois vieram as descobertas.
Descobrimos um ao outro, afinidades e diferenças.
Em alguns dias conversamos muito; em outros, pelo menos um de nós não estava pra conversa
quantos minutos, quantas declarações de amor cada um de nós fez questão de perder
para que conseguíssemos um ao outro prender
Cada um de nós fez seus sacrifícios e cada um de nós sentiu-se feliz por motivos comuns e motivos particulares.
Quantos momentos de ternura alimentaram a nossa paixão...
quanta desatenção eu derramei sobre o calor do que ela sentia
Brigamos muitas vezes e muitas vezes fizemos amor.
e as duas coisas fizeram com que tudo desse certo
e as três coisas fizeram com que seguíssemos em frente
e as quatro coisas, com que seguíssemos juntos
e cada coisa é uma escolha que teve de ser feita
e em cada escolha que virá buscaremos a certeza que já conquistamos:
a certeza
de que a pessoa certa está ouvindo eu te amo.

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Vendo este imóvel e outros desencontros

Aviso logo que não vou me apresentar. Nada vale que eu diga um nome, idade, altura, cor de olhos, tamanho do pé, profissão, sexo, afinal, sendo eu uma personagem, nada garante que eu seja coisa alguma do que for dito e, caso eu seja real, não gostaria de ser reconhecido assim, por um estranho que me lê. Melhor que nos conheçamos ao acaso, que é a mola propulsora da vida, em todo caso.

Era sexta-feira e eu saíra do trabalho por volta das 18h. Tomei algumas cervejas e conversei o de sempre com a turma do bar, ali na Castro Alves, saindo às 22h em busca de uma boa noite de sono que, antes disso, tornou-se uma interrogação absurda e constante em minha vida, ou melhor, interrogações: bebi além do que imagino ter bebido? Terei de entrar no tarja preta? Estive sonhando que saí do trabalho e passei no bar antes de ir pra casa? Será que é a língua, como entidade viva, querendo se desdobrar diante de mim na forma de uma grande língua longilínea, me explicando que, embora o léxico seja limitado, as possibilidades de gerar sentido são infinitas?

Pois é, meu chapa, ando desassossegado desde que, nesse dia, passando por uma dessas ruelas do Méier, percebi uma linda casinha ( a qual não convém descrever pelos mesmos motivos que julguei conveniente omitir minha apresentação ) com uma placa pendurada em seu portão: Vendo este imóvel.

Eu não vinha pensando em me mudar; simplesmente o imóvel era tão atraente que me deixei ficar ali por um longo tempo, parado, observando cada detalhe da construção e jardinagem, até que percebi um senhor à janela, supostamente olhando pra mim.

- Boa noite, estava admirando sua bela residência.
- Não está à venda.
- Mas a placa diz...
- Não está à venda. Repetiu o velho me interrompendo novamente, sem no entanto utilizar de aspereza ou má educação aparente. Seu tom de voz era ameno.
- Na placa só diz o que fazíamos até começarmos a falar. Prosseguiu.
- Desculpe, não compreendo.
- Eu esperava que não, mas explico. Gostaria de entrar para conhecer a casa por dentro enquanto isso?

Aceitei o convite ainda pensando no que fora dito à entrada, desconfiando de que o velhinho era piroca das ideias. Apesar disso, encontrei uma casa adorável, com amplos ambientes, bem arejada, embora com muitos móveis com muitas gavetas. Também havia muitas portas, que eram ao mesmo tempo entradas e saídas, como qualquer porta. Em poucos minutos percebi que em cada cômodo havia placas: Vendo este corredor, Vendo este quadro, Vendo esta porta fechada, Vendo este piso acarpetado, Vendo estas venezianas espanadas recentenmente, Vendo o movimento dos peixes neste aquário. E pensei em sair de lá imediatamente. De repente, ao mesmo tempo em que o velho me ofereceu um copo de suco de manga dizendo "Não vendo o gosto do suco de manga", a imagem de sua boca  falando veio clara em minha mente: "Na placa só diz o que fazíamos até começarmos a falar."

Foi assim que tudo: o copo, o velho, a casa viraram língua. Inexplicavelemente sem medo, de dentro pra fora, percebi que a língua era eu, e fui engolido por mim mesmo, sorrindo com um último pensamento: velho-sacana-filho-da-puta.

domingo, 2 de outubro de 2011

Limpo e claro

Você me diz que não tem certeza
Meu bem, a certeza é só um luxo
e o luxo é conquistado pouco a pouco
e não há motivos pra ter pressa
mesmo quando a perda de tempo causa tanta dor.

O que eu quero dizer, meu bem
é que não existem alegorias pra explicar
um sentimento.
Não existem meias-palavras.
Simplesmente um sentimento nasce e você sente,
como uma espinha ou um câncer.

sábado, 1 de outubro de 2011

Retorno das férias / Resposta tardia à Meccamputechture

Pessoal, peço desculpas aos que leem este blog, pois sumi do nada. Tirei férias forçadas dos textos, andei sem tempo. Tinha vontade de escrever e não podia. Voltei. E, neste domingo, prometo a publicação que dará continuidade a esse blog de entretenimento.

Agora, uma breve resposta - merecida - ao grande comentário de Meccamputechture sobre o último texto que publiquei, O caso Eliana.

Em primeiro lugar, agradeço de verdade pelas dicas e aproveito pra dizer que esse tempo todo que você dedicou neste extenso comentário, foi o que realmente encheu meu ego. Meu objetivo foi atingido e todas elas me serão úteis de alguma forma, algumas por serem ignoradas, outras não. O fato é que percebi que você é um bom leitor, ou seja, tem gosto pela leitura de literatura, mas, por outro lado, recomendo que leia um pouco de Teoria Literária, pra não repetir alguns equívocos, diga-se de passagem, normais, comigo ou com outros autores. Explico um pouco:

Você escreveu: "Foi a demonstração de que VOCÊ CONCORDA com essa tortura." Pois bem, um dos preceitos básicos da Teoria Literária é a de que nem tudo o que o autor escreve reflete sua opinião, uma vez que os textos são de ficção e personagens distintos são criados com visões de mundo distintas, afinal, se não fosse isso, você estaria lendo, na verdade, o trabalho de um jornalista, o que não é o caso.

Quando você diz que consegue visualizar o título do texto (O caso Eliana) no Meia-hora, mais uma vez tive meu objetivo atingido, nobre leitor, pois qual você acredita ter sido a minha intenção ao escrever no último parágrafo o seguinte: "Alguns tablóides sensacionalistas, com seu senso de humor duvidoso, batizaram o crime como “O caso Eliana”, por causa da música dos dedinhos." Note ainda que usei a expressão "com seu senso de humor duvidoso" você tem certeza de que concordo com tudo??

Bom, o resto é questão de gosto.

Obrigado por me fazer refletir sobre o modo como escrevo, isso ajuda um escritor iniciante a crescer.

Continue acompanhando as próximas publicações com seu senso crítico aguçado.
Abraço do Ladrão.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

O caso Eliana

Em Julho de 2007, houve um caso que ganhou grande projeção na mídia nacional por conta de suas características incomuns, ao menos aqui no Brasil. A estudante Laís, do curso de Comunicação de uma renomada faculdade particular do Rio de Janeiro, foi sequestrada e assassinada por um colega de classe chamado Pedro Motta, que a filmou durante os 3 meses de cativeiro, obrigando-a a responder perguntas que eram os motivos desencadeadores da decisão do sequestro. O caso tornou-se um livro interessante pela riqueza dos detalhes transcritos que o material filmado forneceu e certamente servirá para o estudo das psicopatologias, sua origem e desenvolvimento.


Tive acesso aos vídeos e posso afirmar que quase nada foi dito durante todas as 1.157 horas de filmagem. O diálogo foi maior no começo, no primeiro vídeo principalmente, onde o sequestrador tenta justificar-se com sua vítima e, provavelmente esperando piedade da lei, mostrando porque ele estava certo e ela errada, depois o que segue são cenas de tortura. Três meses de tortura registrados.

“Eu sou louca por um cara lá da faculdade, mas ele não dá a mínima pra mim.”
“Qual é o nome dele?”
“Por favor, me solta, Pedrinho”
“Pedrinho?! O que o medo não faz....eu era o punheteiro nojento, lembra que você me chamou assim? Vocês piranhas acham que podem fazer isso com as pessoas que respeitam vocês mas ficam se oferecendo a qualquer preço pros caras que tratam vocês como merda. FALA O NOME DELE SUA PUTA!”
“TÁ BOM... tá ...eu falo...o nome dele é Rodrigo”
“Isso. Esse é um cara legal, respeito o Rodrigo. Trata bem todo mundo, até uma idiota que nem você que não respeita o amor dele pela sua noiva só porque ninguém te respeita. Ninguém te respeita porque você é uma vadia, Laís, porra.”

Nesse momento Pedro solta uma sequência de socos na cabeça de Laís, que implora para que ele pare, mas nada o deteria naquele momento. Ele tinha raiva da bela garota que Laís poderia ser, não fosse o fato de saber que jamais a teria, ainda mais agora, que decidira torturá-la.

“Agora conta pra todo mundo as coisas que você fazia pro Rodrigo te comer”.
“Por favor, Pedro, me deixa em paz” – Dizia entre soluços.
“Você vai ficar em paz, mas antes vai contar pra todo mundo o que eu mandar. Tua família vai saber que você é uma garota estúpida e arrogante e puta. Agora fala do dia da chopada”

Ela hesitava em contar, mas a cada hesitação, era uma chuva de socos na cabeça.

“Naquela chopada da faculdade que ele foi com a noiva dele, eu fiquei dando mole a noite toda, dançando, rebolava até o chão olhando pra ele mas se ele viu duas vezes foi muito. Então, no final, como eu tava bêbada, entrei no banheiro junto com ele e tirei minha calcinha e me debrucei na pia, virada de costas pra ele, mas ele balançou a cabeça negativamente e saiu. Nunca me senti pior”.
“Foi nessa hora que eu entrei e te vi lá, chorando sentada no vaso e perguntei o que tinha acontecido e você disse sai daqui seu punheteiro nojento. Não tem nem um mês isso, certo?”
“Sim...mas eu tava nervosa...”
“Tudo bem. Relaxa que isso vai acabar”.

Então ele sumiu por cerca de 15 minutos. Durante esse tempo, Laís lutou para libertar-se, mas os nós que a prendiam na cadeira eram muito firmes. Pedro retornou em silêncio com uma faca de cozinha na mão e com um gesto largo fez um enorme corte no braço da garota, que sangrou muito, e saiu do cômodo, voltando horas mais tarde, ainda sem pronunciar palavra alguma, com agulha e linha e costurou o braço que cortara, tendo como acompanhamento os grunhidos da cadela.

E todos os dias pela manhã, após alimentá-la, ele fazia as mesmas perguntas sem dizer mais nada e dava uma boa surra matinal na garota, concentrando-se na cabeça e em espetá-la com pregos por todo o corpo – e ele fez isso todos os dias, até o fim – de modo que em pouco tempo a estudante já estava toda cagada e mijada, com uma magreza cadavérica, tossindo muito, sem conseguir falar muita coisa além de um débil “por favor”. Dava pra ver as moscas que por vezes pousavam sobre seu corpo.

No fim dos três meses, Pedro chegou sorridente ao local, saudou Laís com um bom dia, tirou a mochila das costas e não usou a violência nem o questionário de costume. Em vez disso, contou como todos estavam preocupados com seu desaparecimento, como toda a faculdade estava mobilizada, distribuindo panfletos desde a primeira semana após o sequestro. Falava em um tom descontraído que a família fez apelos na Televisão para que sua querida filha aparecesse, junto com todo aquele drama, dizendo que era uma menina feliz, que sonhava ter sua própria agência de publicidade e blá blá blá...e mostravam fotos de quando era criança. Nunca mostravam fotos dela bêbada no banheiro sem calcinha oferecendo cu pra um homem. Por fim, anunciou:

“Mas fique tranquila, esse sofrimento acaba hoje. Você FINALMENTE TERÁ DESCANSO!” – disse animado, como quem anuncia um prêmio.

Abriu então a mochila tirou, sabonete, esponja e toalha. Deu um longo banho morno em Laís, ensaboando com carinho a paciência todo o seu corpo. A estudante estava aliviada, chegou mesmo a chorar sob a delicadeza do rapaz, que dizia: “Nossa, você está horrível. Não tem noção de como você está acabada” . Secou seu corpo, deitou-a em um colchonete que trouxera há poucos dias e fez amor com a cheirosa moribunda. Virou-a de bruços e, enquanto metia, depois de muitos dias voltou a ouvir a voz da garota, que gritava enquanto, um por um, seus dedos eram quebrados. Gozou.

Como se Laís não estivesse lá, gritando de dor, Pedro arrancou friamente cada um de seus dez dedos, distribuindo metade em seu canal vaginal e a outra metade introduzindo no reto da vítima. Ao terminar, simplesmente arrumou sua mochila e partiu, deixando-a nua, com as mãos e os pés amarrados às costas. Não retornou mais ao local. A estudante agonizou até a morte, sendo encontrada oito dias depois pela polícia local após uma denúncia anônima.

Ainda lembro o choque da opinião pública pelas ruas e bares da cidade na manhã seguinte à prisão do assassino:

- Viu aquele tarado que prenderam ontem? O filho-da-puta arrancou os dez dedos da garota e enfiou no cu e na buceta dela ainda viva.

Alguns tablóides sensacionalistas, com seu senso de humor duvidoso, batizaram o crime como “O caso Eliana”, por causa da música dos dedinhos.

quinta-feira, 16 de junho de 2011

Conversa pra boi dormir

- Tem gente que parece que nasceu mesmo pra atrasar a vida dos outros, Né? Uns troços que não sabem fazer mais nada além de tomar conta da vida alheia, andar devagar na sua frente quando você tá com pressa e ocupar dois lugares no banco do ônibus, que nem aquela gorda que morava perto da tua mãe, lembra?


- É. Quero nem falar nessas porras.

- Sabe, andei pensando sobre uma coisa que constatei depois de ler a geração Beat e outros autores mais contemporâneos: parece que é pré-requisito ser viado pra ser literatura de moderna, parece que é a única forma de subversão em um momento que parece que não temos nada pelo que lutar, parece um monte de adolescente entediado saindo do armário. Os últimos escritores que acredito terem sido homens de verdade, grosseiros e preconceituosos –e por isso mais verdadeiros, pois não escondem nada- são o velho Bukowski, Henry Miller e Fausto Wolff. Eles falavam abertamente, por meio alter-egos, personagens e narradores, sobre qualquer assunto que lhes ocorresse, incluindo seus preconceitos,quebrando verdadeiramente o status quo. Não estou dizendo que Ginsberg, Burroughs, Cassady, Gide, Garcia LLorca, Capote e companhia são ruins, pelo contrário, seus textos são geniais e todos de fato contribuíram pra uma literatura mais honesta e acessível mas todos curtiam levar uma linguiçada na bunda e exageravam ao levantar a bandeira. Mas me parece que, na literatura, essa coisa de ostentar purpurina foi mais ruidosa, até porque a literatura hoje em dia já não tem o impacto e o alcance de outrora e, além do mais, o estímulo ao homossexualismo vem de todas as partes e crescendo desde a década de 80, pelo menos aqui no Brasil, onde músicos como Cazuza, influenciado pelos ecritores Beatnicks desvairados, escancarou o rabo diante das pessoas, com seu indiscutível talento, o que certamente falta às mais novas gerações de artistas e escritores. Criou-se a idéia de que é “cult” não ter preconceitos e, de fato não deveríamos ter, mas o fato é que temos, caralho!

- Verdade...

- Sei que a homossexualidade é antiga pra caramba e que existem escritores mais antigos que gostavam de se agarrar em uma piroca veiuda; eu não estou criticando a orientação sexual de ninguém, embora seja bem verdade que não é a minha praia. Vou pegar mais uma garrafa desse vinho. Sabia que já até pensei em jogar nos times? Hahaha! Sério, pelo menos fingir que sou viado, sei lá, colocar umas fotos com um cachorrinho em um carrinho de bebê no álbum “Meu amor” do facebook. Pelo menos acho que seria engraçado, você não acha?

- Nem vou comentar.

De repente o mais eloqüente na enorme sala era o silêncio; quase dava pra ouvir um pensamento, caso alguém pensasse alguma coisa, pois nesse momento o vinho já deixara o velho escritor e seu interlocutor um tanto sonolentos. A região dos lagos do Rio de Janeiro era sombria e deserta no inverno e a casa ficava isolada em uma grande fazenda com algumas cabeças de gado, sem vizinhos. Eram cerca de uma e quinze da madrugada e o vento convidava todos a se protegerem do frio. Do lado de fora da casa, alheios à conversa, os bois dormiam desde o anoitecer.

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Um presente e um futuro

Pra te dar um presente

Eu quis comprar alguns pares de sapato
Eu quis comprar um jeans que aqueceria seu corpo
Eu quis comprar algumas garrafas do seu vinho preferido
Eu quis comprar rosas vermelhas que se abririam,
- Crescendo em beleza como há de crescer nosso amor –
E morreriam cansadas e murchas
Como um dia estaremos, nunca o nosso amor.

Eu sonho assim.

Tentei escrever um poema
Um romance
Uma canção
...

Eu quis te dar um longo beijo
E puxar o seu cabelo com firmeza e cuidado
Arrepiar teu corpo e esquentar teu sangue
E nisso,
Arrepiar meu corpo e esquentar meu sangue

Eu quis fazer amor com você.

Depois eu te quis imortal
mas percebi o absurdo de o querer
e quis ter força e coragem pra te dar proteção
e quis ter sabedoria pra te oferecer confiança
E hoje eu só quero te dar alegria amanhã

E depois
E depois
E depois

Eu quero aprender contigo e te ensinar alguma lição.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Mulher preta faz macumba

Adolfo frequentemente dizia, orgulhoso de si, ser um sujeito sem qualquer tipo de preconceito, que todos somos iguais e outros bordões utilizados por pessoas que querem mostrar alguma coisa o tempo todo. Dizem que todos temos algum preconceito, mesmo que não nos orgulhemos disso e o escondamos, mas ele afirma que isso é besteira e que um povo tão misturado como o brasileiro não pode ter preconceitos. Adolfo é desses, tanto que, quando não estava por perto algumas pessoas, na brincadeira, quando queriam se referir a ele chamavam-no de Adolf.

Ocorre que, como na maioria das vezes, quando existe muito esforço em querer mostrar certa “atitude”, o bunda rachada era hipócrita. Não que suas intenções não fossem sinceras, mas ele o era sem perceber. Suas afirmações, inclusive, eram todas muito coerentes, tendo por base a história em defesa de suas idéias. Dizia em conversa com um amigo:

- O problema é que o preto, sempre foi associado com coisas negativas, mesmo pela natureza, basta lembrar que quando vai haver tempestade, o céu fica negro. Quando anoitece é maior a incidência de crimes, pois a noite oferece as sombras aos gatunos e malfeitores. Algumas religiões também reforçam essa idéia ao associar as forças negativas e espíritos malignos ao reino da escuridão. Na Idade Média, houve uma epidemia Peste Bubônica, que dizimou grande parte da população européia, e que por ser desconhecida e ter causado tamanha tragédia, foi batizada de Peste Negra. As justificativas para os racistas são muitas, mas, ainda assim, injustificáveis, e não param somente em tudo isso que falei, porque ainda temos o tráfico negreiro, onde um preto era trocado por uma garrafa de cachaça e um pouco de fumo, era escravizado e humilhado por seu dono. Temos o Nazismo e a Ku Klux Klan. Temos Machado de Assis, clássico de nossa literatura, negro, que teve, ao falecer, uma “honraria” concedida como reconhecimento dos seus contemporâneos pela sua genialidade, sendo enterrado como BRANCO e dispomos em nossa língua de expressões do tipo: “a coisa tá preta”, “ele é negro mas tem alma de branco”, “preto quando não caga na entrada, caga na saída”. Fico puto da vida, precisamos reverter isso.

O amigo, concordando plenamente, completa:
- Falando nisso, te chamei hoje aqui pra gente tomar essa cerveja só pra te dizer que comi uma pretinha ontem, que puta-que-pariu, é maravilhosa. Ela é linda, inteligente e tem um corpo sensacional...

E Adolfo:

- Sei como é, mas cuidado, porque mulher preta faz macumba.




quinta-feira, 26 de maio de 2011

Eu sou melhor que um cão

Um cão passa ao meu lado

Uma multidão passa por mim
Um fudido fica pra trás

Tocando muito mal em uma sanfona ,algo que lembra vagamente
“Asa Branca”
E havia um pequeno pote diante dele com duas ou três moedas
apenas.

Ele certamente desistiu da vida. Só pode ser.

Ela sofre de gastrite por causa da pressão que sofre no emprego
De segunda a sábado.
Ela sempre foi muito responsável e disciplinada. Ela vive para o trabalho.

O que a está deixando doente

Parece ter desistido da vida.

Ele é um grande intelectual
Desistiu da vida
Ele é afundou-se no álcool
Desistiu da vida

E cada um tem uma balança
Onde desequilibra cada qual sua existência
e acho que os cães não têm do que desistir

...

De repente ele se levantava durante a madrugada e caminhava pela casa. Normal. A diferença é que agora ele acordava a todos, fazendo muito barulho, batendo de cabeça em paredes e móveis, desorientado, caindo no chão como quem tropeça e, desta forma, teve seu fim em um leito e uma pressão desgraçada de um tumor em seu cérebro, que o fazia passar horas a fio gritando de dor.

Assim morreu meu cachorro. O assunto ficou mais leve, não?

E acho que os cães não têm muito do que se arrepender
E não sei no que sou melhor do que um cão.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Gozação, chacota, zombaria, sacanagem...

Empunhou a velha carabina que herdara de seu pai , fechou a porta atrás de si e montou em sua moto, sabendo que deixava para trás mais do que meros problemas infanto-juvenis. Finalmente ele se reconhecia como um homem, sentindo o peso de séculos de masculinidade, poder e respeito que aquele objeto representava. Não havia mais preocupação em ser alvo da crueldade dos outros garotos ou do desprezo das meninas, pois ele era homem. Um homem maduro e armado.

Muito magro, educado e tímido, transmitia uma delicadeza tal que rapidamente tornou-se alvo das brincadeiras cruéis da garotada, mesmo das garotas, que também adoravam chamá-lo de “bambi”. As meninas geralmente são amigas de homossexuais, mas nem essa simpatia, embora não fosse viado, ele conseguia conquistar, de modo que fazia de tudo pra não ter o desprazer de enfrentar mais um dia naquele lugar estúpido, onde todos buscavam e admiravam um padrão de comportamento e beleza imposto sabe-se lá por quem. Importavam-se com valores superficiais, egoístas e mesquinhos, desprezando uma pessoa fantástica por conta de uma aparência afeminada. Esses merdas metidos a machões e essas piranhas sem valor um dia teriam o que mereciam e ele sabia disso, ansiava por isso, mas enquanto esse dia não chegava, se acabava na punheta pensando nas putinhas da escola. E chorava muito também.
Na maioria das vezes, quando a coisa não está boa, sempre acaba piorando. Por algum motivo, que ele não soube explicar mas pôs na conta de Deus, um pelo inflamou em sua bunda. Os outros caras, fortes e extrovertidos, nunca tiveram esse tipo de “doença” idiota, pensava enquanto ia obrigado pra aula. O fato é que não dava pra andar direito e, nem bem chegou na escola, um filho de uma puta lá longe já começou a sacanear, apontando o dedo de forma espalhafatosa em sua direção: “IÁÁÁÁ! Olha como ele tá andando. Deu muito essa bundinha ontem é, seu ARROMBADO?” e a garotada toda começou a rir e sacanear o moleque, que foi ficando puto da vida, até que ameaçou a todos, tomado pela raiva: “VÃO SE FUDER SEUS MERDAS. EU ODEIO VOCÊS. EU VOU MATAR VOCÊS” , enquanto a galera gritava coisas como arrombado, viadinho, safada, piranhuda...e o desgraçado nem podia sair correndo de lá por causa da bunda inflamada.

Mas isso foi lá no início do ensino fundamental.

Conforme aproximava-se da antiga escola, a lembrança do ódio que sentira descarregava adrenalina por todo o seu corpo, que queimava e suava em um delírio de vingança. Parou por um instante diante da entrada, ofegante, observando os alunos que chegavam pra mais um dia de pressão, em que cada um deveria parecer confiante, extrovertido, feliz, bem-sucedido agora e na vida. Lembrou-se dos cadernos de perguntas, onde sempre havia uma do tipo “que animal você é?”, cuja resposta de todos era geralmente, leão, tigre ou águia, enquanto ele só conseguia ouvir em sua cabeça as vozes dizendo “bambibambifrouxoviadoviadinhobambiarrombadoflorzinha”. De qualquer foma, o caderno geralmente nem chegava em suas mãos. Pensou nisso tudo e pensou em como o sistema educacional brasileiro é falho, como desestimula o mais estimulado professor que, por conseguinte, desestimula os alunos que, por sua vez, estão mais preocupados em mostrar o que a sociedade de um modo geral gostaria que fossem: cidadãos competitivos e maus. Então respirou fundo, olhou para a bolsa onde estava a arma e deu a partida em sua motocicleta, seguindo rumo à região dos lagos, onde o esperavam para caçar em um grande assentamento de sem-terras e pensou que agora era a vez de outras crianças passarem por tudo isso, desejando sorte a todas, afinal, ele passou e hoje goza de boa vida no que diz respeito a si mesmo. Basta dizer que não carrega grandes traumas.

Em tempos de guerra contra o que agora chamam de Bullying mas que não passa da boa e velha , gozação, chacota, zombaria, sacanagem, zoação, troça ou qualquer outro nome que se queira dar, é bom lembrar que somos historicamente cruéis. Alguns sobrevivem, outros não. E ponto.

sábado, 14 de maio de 2011

Falácia

Dizem
que o trabalho dignifica
o homem
Dizem
que aqui se faz e aqui
se paga
e que não se cospe no prato
onde se come

Dizem
que a beleza está nos olhos
de quem vê
Dizem
que a justiça tarda mas
não falha
e que com saúde e paz é fácil
viver

mas esqueceram da sorte
se talvez a sorte existir

e de outras variáveis
muito apreciadas pela raça
Falo
de grana
e mau caratismo
Falo de Judas, Caim,
Hitler
e Idi Amin
Falo de ignorância
estupidez, radicalismo
e arrogância

EU TÔ FALANDO É DESSA PUTARIA TODA

sem jamais
descartar a esperança



.

sábado, 16 de abril de 2011

O erro, preço e a alternativa

Antes que pudesse perceber, a criança se afastara perigosamente para desvendar os limites do lugar. Havia um lago com muitos patinhos, peixes de diversos tamanhos e cores, e cisnes, que eram certamente muito atraentes aos olhos da pequena.

Naquela manhã de domingo, Yasmin acordou bem cedo, por volta das oito da manhã, e foi ao quarto da mãe pedir mamadeira. Laura levantou-se ainda bem na merda por conta da noite anterior, preparou o chocolate com leite da menina e foram as duas pra sua cama, voltar ao sono, mas a pequerrucha não queria mais saber de dormir e só falava em brincar no parque, promessa feita na noite anterior, pra que a criança ficasse com a avó sem chorar e, como todos sabemos, as crianças nunca esquecem uma promessa de diversão. Yasmin tanto falou, que a mãe zangou com ela, que, por sua vez, começou a chorar, muito magoada. Laura amava demais aquela criaturinha linda, razão de seu viver, e percebeu que fora injusta e que sua ressaca não era motivo pra magoar a pobrezinha. E foram ao parque.

Chegando à Quinta da Boa Vista, nos lindos jardins imperiais, a menina tratou logo de tirar as sandálias e sentir a grama úmida sob os pés, ao passo que Laura sofria de um intenso mal estar. Suava frio, tremia um pouco, estava muito enjoada e com o cérebro solto dentro da cabeça, doendo muito, mas, apesar de tudo, satisfeita pela felicidade da filha, que gritava: - Duvido você me pegar, mamãe! - Enquanto saía correndo toda desengonçadinha e linda, de modo que a mãe não resistia e brincava o quanto podia, até que Yasmin resolveu parar um pouco pra descansar, já no comecinho da tarde, e caíram as duas em uma sonequinha boa, esticadas sobre a canga no gramado fofinho, até que, exatamente às 15h 52 min, Laura acordou por conta de um certo alarde de algumas pessoas à beira do lago, percebendo simultaneamente que Yasmin não estava ao seu lado. Instinto materno, saiu em disparada em direção ao grupo.

Sua princesinha Havia acordado momentos antes e foi brincar perto do lago, onde assustou-se com um pato que surgira perto de si, caindo no lago. A garota estava estendida no gramado, com seus labiozinhos azulados e a respiração cessada. O resto é sofrimento.

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(Com muita peninha de ter matado a pobre Yasmin, o autor que vos fala decidiu-se por um final alternativo, o qual segue abaixo)

Sua princesinha Havia acordado momentos antes e foi brincar perto do lago, onde um patinho surgiu perto de si. A garota estava estendida no gramado, sem conseguir chorar, desesperada com um patinho nos braços. Segundo o pessoal que a cercava, Yasmin provavelmente pensou tratar-se de um brinquedinho e arrancou a cabeça da avezinha. Laura, por sua vez, não pôde conter o alívio que sentira e caiu em prantos, abraçada à filha, confortando sua cabecinha atrordoada.

FIM!

quarta-feira, 6 de abril de 2011

A ironia da evolução

Era a pessoa mais sábia do lugarejo. É bem verdade que isso não significa muita coisa, pois a localidade é uma espécie de microcosmo da Bruzundanga de Lima Barreto, mas acontece que a história precisa ter um começo.

Mesmo os mais céticos, em algum momento, recorrem, recorreram ou recorrerão à ela pois, no desespero, a gente apela pra qualquer coisa; o ateu reza, o evangélico vai na benzedeira, ou então procuramos a pessoa mais sábia da aldeia, como faziam nossos antepassados indígenas, e como fazem os habitantes deste curioso povoado, que parecem não ter se decidido entre o passado e o futuro, adorando o Deus-Tecnologia ao mesmo tempo em que praticam simpatias e outros tipos de crendices sem qualquer comprovação científica.

Dia desses, uma nordestina assanhada que atendia pelo nome de Francinete e mudou-se pra lá para viver com seu marido, recorreu à luz da guru (que aconselhava os que a procuravam sobre os mais diversos assuntos, cobrando apenas uma bala de morango), pois começara a perceber ou imaginar um certo desinteresse por parte do esposo, o qual não dava um trato na boneca havia alguns dias. Pois bem, após desabafar seus medos e dúvidas, obteve a resposta: "que tal você fazer um chá beeeeeem gostoso?" Francinete sorriu e julgou ter compreendido a mensagem. Agradeceu em êxtase e, já na rua, pôs-se a pensar: "vô dar um chá de buceta em Everaldo que o pau dele nunca mais vai descer".

Um outro senhor endividou-se com um agiota, o que lhe gerou ameaças contra sua integridade física e de sua família; desesperado, procurou pela sábia guru contando seu dissabor, recebendo como conselho que "é legal dar um pulo bem grandão!". Entre lágrimas, o velho concluiu que a honra de seu nome e a segurança de sua família eram o que possuía de mais valioso e atirou-se da varanda do apartamento onde passara toda a sua vida conjugal ao lado da esposa, que também já se havia aconselhado acerca de uma proposta de emprego.

Chamavam-na Sinhazinha, e hoje, conforme fiquei sabendo, ninguém mais a procura, coisa que não afetou sua vida em absoluto. Sinhazinha atende pelo nome de Vitoria e é uma pessoa que de fato carrega consigo todos os atributos que seu nome pressupõe: é saudável, forte de corpo e mente, determinada, astuta, carismática, bondosa sem ser otária e linda.

Fico devendo o nome e o modo como iniciei minha conversa com o camarada que me contou essa história, o que, de qualquer forma, seria informação desnecessária, pois todos sabemos que no bar as amizades são tão fáceis quanto efêmeras. Posso é dizer como fiquei curioso por saber o motivo pelo qual deixaram de procurá-la, trocando esta sensação pelas de surpresa, deslumbramento e tristeza misturadas ao receber a resposta:

- Sinhazinha tinha 3 anos. Conforme foi crescendo, tornou-se ignorante como outro qualquer.

sábado, 19 de março de 2011

Alegria (Laetitia) - lágrimas em 1976

Durante a batalha perdi muitas vidas, e muitas delas de nada valiam, mas só pude chegar a tal conclusão após ter perdido a mais valiosa de todas elas.

Tudo transcorreu de forma rápida, de modo que, quando dei por mim estava correndo atrás de um fantasma, tudo por que tanto me esforcei se esquivava pra longe de mim e quem morria, na verdade,era eu, após ter dado passos mais largos do que me eram possíveis, após tropeçar em minhas próprias pernas, caminhando sem avaliar o terreno por onde me aventurava, sem medir as consequências de onde pisava, pois em cada espaço em que pisamos, deixamos uma marca e eu pisei fundo demais em terreno macio e só nisso, afundei duas vidas. Segui o conselho de Cartola: disfarcei e chorei por ter fracassado em mais uma batalha, mas, insistente que sou, não desisti.

Há os que defendem que a vida é uma sucessão de batalhas. Pois bem, confirmo. Toda a vida é uma batalha por sobreviver e a morte, creio eu, é a mais fácil de se driblar, uma vez que morremos a cada instante, sempre renovamo-nos após a morte de cada um de nossos eus e deslumbramo-nos diante do novo ser que surge. A única batalha, no entanto, que jamas um de nós venceu, é a batalha contra o tempo que, embora não seja linear, faz de nós o que quer. Quem afirma que o passado não tem volta, engana-se profundamente, pois ele volta sim, e volta mais forte neste presente do que no passado de outrora. Volta e volta bruto, tendo por alvos principais de destruição a esperança e o futuro, nos encontrando pelas pegadas que pisamos e deixamos  pra trás, que nunca se apagam, mas acontece que a palavra "cautela" só vem  na frente de "desculpa" no dicionário mesmo, e "desculpa", por sua vez, só vem depois de "perda". Digam o que quiserem os estudiosos da língua brasileira, mas defendo o dicionário como de maior importância.

Foi assim que estou morrendo. Morrendo de uma morte completa. Morrendo de presente, passado e futuro. O passado que pensei ter enterrado também no passado, me apunhalou no presente, afetando, por sua vez, o futuro. A batalha sempre está perdida quando se encontra o amor, pois, quando o encontramos, perdemos a vida de solteiros e se o deixamos morrer, perdemos novamente, desta vez a vida de casal, sem a chance de voltar à mesma vida de antes e fazemos o mesmo com a outra pessoa, então a tudo se torna uma morte em grupo, de certa forma. MORTEMORTEMORTEMORTEMORTEMORTEMORTE. Quisera eu ser homem e amar a morte. Contenhamos nossas lágrimas. Não falo de vocês, falo de "mins".

Preciso descontinuar meu raciocínio. Não posso seguir adiante e não vou enganar a mais ninguém. Só seguirei quando souber que posso. Cartola fica com a palavra.

Bate outra vez

Com esperanças o meu coração
Pois já vai terminando o verão,
Enfim

Volto ao jardim
Com a certeza que devo chorar
Pois bem sei que não queres voltar
Para mim

Queixo-me às rosas,
Mas que bobagem
As rosas não falam
Simplesmente as rosas exalam
O perfume que roubam de ti, ai

Devias vir
Para ver os meus olhos tristonhos
E, quem sabe, sonhavas meus sonhos
Por fim

Não tenho fé nem certeza, apenas esperança e vontade.

quinta-feira, 17 de março de 2011

Palavras não

Eu sei que errei
E sei também
Que ela não merece ouvir de mim
Que reconheço os erros meus
Mas sigo errando mesmo assim

Hoje todos dizem que tudo há de passar
Mas não passa não
Não passa não
Não passa não
O que mais me dói
não é só viver sem ela
É ter magoado seu coração

Hoje eu sei
Que palavras não sustentam
O amor de uma mulher
E quem quiser
um amor pra vida inteira
tome meu pranto por lição

Se não fosse tão cedo
eu não chorava tanto assim
preste atenção quando eu digo
Meu bem, acredite mesmo em mim
a única certeza
é que nosso amor não terá fim

quinta-feira, 3 de março de 2011

A sacanagem

Antes que eu pudesse dizer não ( e eu jamais pensei em dizer ), já estávamos entrando no quarto do motel, nos esfregando ao longo do corredor, agarrados um no sexo do outro como se nunca mais fôssemos largar e o amor aconteceu

com a indispensável sacanagem

Antes que pudesse dizer não, envolvera-se em um esquema de fraude, desviando medicamentos do hospital público onde trabalhava, tirando possivelmente o único alento de um monte de gente fudida, mas em sua maioria gente digna que vai morrer

com a devida sacanagem

Antes de entregar a coroa, mataram os nativos e levaram todo o nosso ouro. Antes de passar para os civis, mataram os nativos e endividaram o país todo. Antes de ser escurraçado, confiscou o que guardamos e muitos nativos se mataram.

por causa de tanta sacanagem

Antes que pudesse defender-se, cinco rapazes de classe média-alta o cercaram e o cobriram de porrada. O viadinho ficou todo moído, internado em estado grave e sabe que isso é sacanagem, mas vai ter medo de denunciar os covardes e o viado e os rapazes continuarão

fazendo suas sacanagens

Antes que possamos desfrutar do resultado de nosso trabalho, já descontam quase todo o nosso ordenado, outra parte fica no transporte deficiente e caro, a comida na mesa, um agrado pra patroa e a conta do bar do mês passado. O que bebemos hoje tem que ficar pendurado.

mas levamos na sacanagem

Mas não confundam a nossa paciência
com subserviência

AQUI NÃO EXISTE BOM SELVAGEM !

domingo, 27 de fevereiro de 2011

Anedotas violentas

Ódio: Aversão inveterada e absoluta; raiva; rancor; antipatia.



O trem estava vazio e o tempo aprazível, com o céu azul mas sem muito calor. Blusão aberto e picolé de manga pra visitar a namorada que não vejo desde ontem, quando assisti o mengão campeão pelo primeiro turno do carioca, o que significa dizer que nada poderia me tirar do sério, como uma possível falha no sistema ferroviário. Contratempo insignificante. Pois bem, a falha não ocorreu mesmo, de modo que permaneci budista na expressão, até o momento de descer na estação de São Francisco Xavier (lembrem-se de que o vagão estava vazio) e uma velha querer entrar pelo mesmo espaço e ao mesmo tempo em que eu saía pela porta. Em um impulso de intolerância diante dessa postura escrota, resmunguei alto e abrindo os braços: caaaalma, caralho! E, de cara fechada, dei uma forte cotovelada na costela da velha, mas era amor o que me esperava.


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Marcelo era o craque do bairro, desde muito jovem seu pai percebeu o talento do moleque e, conforme crescia, a previsão do pai ganhava consistência. No campinho de terra não tinha pra ninguém e todos o queriam no time, claro. Com 15 anos começou a treinar na escolinha de futebol do maior clube brasileiro e dentro de pouco tempo ganhou destaque nas categorias de base, sendo elogiado por colegas de bola e treinadores, que diziam: a gente tem que dar um jeito de segurar esse moleque aqui, senão ele vai pra europa em menos de uma temporada.

Personalidade forte é uma faca de dois gumes; pra passar de qualidade pra defeito é um piscar de olhos, e Marcelo era desses. Competitivo, passava dos limites quando o time estava em dificuldades e brigava com os companheiros, mesmo nas peladas no campo de terra, onde certa vez acertou um soco na cara do Russo, que na ocasião era o zagueiro da pelada e, segundo Marcelo, o culpado pelo gol que levou seu time à derrota. O garoto foi embora com a boca sangrando e o orgulho ferido, sem dizer uma palavra, e foi assim que a raiva tomou proporções incontroláveis. Russo se vingaria minutos mais tarde.

Marcelinho, como o chamavam, cometeu dois grandes erros além de levar as coisas muito a sério; ele desmoralizou um homem em público e esqueceu que homem hoje em dia resolve as coisas na bala, e pra deixar de ser babaca, tomou dois tiros no peito, caindo na pequena área.


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Viviane é muito gente fina, querida por todos em Madureira, onde mora e trabalha de segunda à sexta como vendedora. Gostosa e boa de samba, sempre que pode vai sambar na Portela, onde também é tratada com admiração e carinho por homens e mulheres, o que, como todos sabemos, desperta a inveja das outras. Pra piorar sua situação, ontem deu uns beijos no Paulo, por quem Irene é apaixonada. Já viu a merda que vai dar né? Mulher quando quer ser má é mais eficiente do que quando quer ser boa e por conta disso, Viviane vai ficar um tempo sem trabalhar, pois a Irene vai dar um jeito de queimar seu rosto. Muita sacanagem.

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FUDEU, PARCEIRO! ELES TÃO INVADINDO! FUDEU! LARGA O DEDO NESSES VERME FILHADAPUTA!
TÁTÁTÁTÁTÁTÁTÁTÁTÁTÁTÁTÁTÁTÁTÁTÁTÁTÁTÁTÁTÁTÁTÁTÁTÁTÁTÁTÁTÁTÁ...
Embaixo de nossas camas, esperamos a trégua.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

O ponto de vista

Falávamos de amor como quem aguarda uma sentença
sem saber que a liberdade
está em poder escolher uma      única pessoa     no meio de tantas outras

Falávamos de sorte como quem conhece o azar
Agora eu sei que é uma questão de ponto de vista
ou talvez algo mais
amanhã pode ser sorte o que hoje não é

Sorte e azar não são casuais

Cobríamos os olhos com vendas muito espessas
e não dava pra enxergar
muita coisa além do que é fácil não lembrar
e agora só conseguimos saber
que vai doer demais ter que esquecer

e isso é muita sorte

sentir falta de ter e medo de perder
discutir com razão ou não e tentar ponderar
e tentar se defender e prestar atenção
enquanto um novo dia vai se anunciando
É morrer de tesão
quando escuta ou quando diz "eu te amo"

É mesmo muita sorte, mas não é uma questão de vida ou morte.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Os reis da selva: uma reflexão sobre a estupidez.

O limite que separa a coragem da estupidez é uma linha muito tênue, bem fininha mesmo. De modo geral, quando a atitude é bem sucedida, denominamo-la como coragem, julgando como idiotice quando dá errado. Não pretendo com isso fazer uma exaltação da covardia ou da imobilidade, trata-se de um breve desenvolvimento baseado em observações feitas por esses olhos já cansados ao longo destes X anos - sim, eu tenho essas frescuras de idade e tô cagando para o que vão pensar. Quando se chega a uma certa altura da vida algumas coisas não fazem mais sentido, como se preocupar demais com os outros. Dizem que o velho volta a ser criança, então que se foda - Pois bem, a verdade é que algumas atitudes imotivadas realmente podem ser bastante estúpidas: uma coisa é você reagir a um assalto, outra coisa é andar por lugares inóspitos com pessoas sem qualificação. Explico:

Certa vez, estive em uma expedição pela floresta amazônica com um grupo de aventureiros que se conheceram pela internet, dentre eles o célebre Vitor (El Ladrón) Motta, famoso ladrão de artes urbano, que jamais fora pego, mesmo em suas tentativas frustradas, como aquela em que tentou interceptar os painéis de Portinari da sede da ONU, em 2010, quando vieram para o Brasil. A ideia me pareceu absurda, megalomaníaca, afnal, os painéis são imensos, mas parece que quando se é muito bom em alguma coisa o ser humano tende a sentir-se intocável, e foi o que aconteceu com este gênio que alguns jornalistas-governistas-sensacionalistas tentaram culpar pela queima do acervo de Oiticica, mas El Ladrón é um amante das artes, não um marginal, mas preciso voltar ao que contava:  O curioso, ou talvez absurdo, é que nenhum de nós sabia nada de línguas ou costumes indígenas; compartilhávamos a certeza de que viviam pelados e arranhavam no português, o que me obriga a corrigir o que disse antes sobre estarmos em uma expedição. Na verdade, foi uma idiotice comum a algumas pessoas, pois nenhum de nós jamais havia saído dos limites da cidade grande e de repente estávamos lá, confiando nos filmes do Rambo pra sobreviver no meio da selva.

Desde o começo tivemos todos os entreveros que uma pessoa normal cogitaria antes de se meter em tal empreitada, como arranjar comida, dormir sem ser atacado por insetos e coisas do tipo. Como se não tivéssemos problemas o suficiente, começamos a ficar de porre constantemente, pois, além da idiotice, compartilhávamos o gosto pelo álcool e quase todos levamos garrafas de bebida na mochila, o que não foi a melhor das ideias, pois assim perdemos nosso primeiro homem, que bateu tiro de meta numa onça que dormia traquilamente e por ela foi devorado enquanto nós corríamos pra longe. Porrada então tinha sempre, mas nada fatal, só mesmo uns golpes trocados por conta do nervosismo de descobrirmos que fizemos merda e não dava mais pra retroceder. Eu ficava na minha, só pensando que enquanto estávamos lá morrendo um por um, a Vila Mimosa estava cheia de garotas andando só de calcinha pelas ruas, os homens tomando suas cervejas...e eu nem podia tocar uma punheta, com medo de algum macaco arrancar meu pau do nada, afinal, macaco quer banana.

Eu e El Ladrón fomos os únicos sobreviventes de um grupo de cerca de 17 pessoas e mantivemos contato por alguns meses, durante os quais travávamos longos debates e relembrávamos nossa malograda aventura, ou a malograda aventura dos que morreram e, de certa forma, do Vitor também, pois, em um de nossos porres, ele ignorou o aviso de um índio sobre o perigo dos candirus, dizendo que nosso bom selvagem estava querendo nos sacanear pra gente passar calor naquela floresta filha da puta e mergulhou pelado no rio. O peixinho então penetrou uretra a dentro e tivemos que amputar o pênis do gênio do roubo, que até implantou uma prótese, mas reclamava que não era a mesma coisa, o que realmente imagino ser verdade e, por isso mesmo, compreendendo sua depressão, não tive surpresa ao saber que se matara após tirar a vida de uma garota de programa.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

4 letras, 2 palavras "por Leticia Melo"


Suor.Sussuros.Volúpia.Respiração.Olhares.Banho.Corposmolhados.
Carinhos.Arranhões.Mordidas.Puxadasdecabelo."Cachorra".Pensame
ntos.Promessas.Posições.Verdades.Cansaço.Passarporcimadocansa
ço.Caras.Bocas.Gestos.Força.Muitaforça.Vontade.Vontadequenãoaca
ba.Sexo.Amor.

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

O monstro do Riachuelo

Enquanto os policiais me arrastavam pra fora com truculência, uma multidão me cercava aos gritos de MONSTRO, FILHO-DA-PUTA, MORRESEUMONSTROFILHODEUMAPUTA, com todas as outras variações possíveis, ao mesmo tempo em que arremessavam objetos em minha direção, de modo que eu só podia torcer pra que atingissem os policias em vez de mim. Por um instante alimentei a ideia de ser um rockstar, afinal, todo aquele espetáculo fora armado por minha causa, mas a hostilidade me trouxe de volta pra realidade. Todo aquele ódio me parecia compreenssível e não havia nada que pudesse ser feito, mas eles pareciam não compreender isso, gritando e arremessando coisas em vão. 

Meu pai sempre me tratou na base da porrada, mas nunca reclamei, pois sempre fui homem pra reconhecer e aceitar meus erros. O problema é que eu só percebia que estava errado depois de ter feito a merda e parece que não mudou muita coisa até hoje, mas, por outro lado, hoje consegui aprender que sempre descobrem seus erros, ou os meus, no caso. O que estou tentando dizer é que nunca houve raiva de minha parte e que realmente não existe explicação pras coisas ruins que sempre fiz. Nunca fui violento, jamais passou pela minha cabeça fazer tal monstruosidade. Não se pode explicar tudo, doutor, certas coisas devem ser aceitas. A morte é o maior exemplo. Claro, sabemos porque morremos, mas não podemos mudar o fato de que vamos morrer e, da mesma forma, eu sempre faço a coisa errada sem saber que estou fazendo e aceito que não posso fazer nada quanto a isso. Nem quero.

Vou tentar exemplificar: certa vez, ali no Riachuelo, perto da fábrica de sorvetes, eu acho que tinha uns 16 anos, passei por um pombo na calçada e notei que ele não conseguia voar e sua pata estava machucada. Sabendo que no mundo dos animais, quem não consegue realizar o que sua natureza exige, acaba morrendo pelas mãos de predadores ou por não conseguir buscar alimento, segundo a teoria evolucionista de darwin, se não me engano, resolvi ajudá-lo, pois eu sabia que ele seria massacrado pela vida, então pisei nele com toda a minha força, mas ele não morreu e como havia piorado a situação, não tive outra alternativa a não ser pisá-lo de novo e tive que fazer isso muitas vezes e as pessoas na rua me olhavam com horror até que finalmente o bicho estourou. Eu estava feliz. Pois bem, não quero justificar nada, só estou exemplificando meus gestos aparentemente sádicos.

Algum vizinho deve ter notado o choro incomum de bebê em minha casa, tanto pelo volume do choro quanto por eu não ter filhos ou qualquer criança que conviva comigo e avisou à polícia. Saí pra comer alguma coisa e quando voltei eles estavam lá. Tomei um soco na boca do estômago e uma porrada na nuca assim que entrei, de surpresa. Encontraram o bebê já morto, com vetígios de sêmen pelo corpo e uma caneta de plástico enterrada até o fundo do seu cuzinho e, consequentemente, alguns órgãos perfurados e, após me colocarem na viatura e me encherem de insultos e porrada, finalmente me perguntaram se fui eu e o motivo; respondi que havia sido eu mesmo e não quis entrar em detalhes com aqueles animais, por isso me limitei a dizer que quando dei por mim, ele dormia feito um anjinho. Senti um golpe na têmpora esquerda e o sangue escorrendo pelo meu pescoço. O bebê está morto e nada vai trazê-lo de volta, mas todos só pensam em vingança, vivem cheios de ódio e, sinceramente, estou de saco cheio. Era só um bebê, aquela porra nem pensava direito.

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

CARNA(VA)L

Para de dizer que não parou pra pensar
Para de dizer "foi impossível parar"
Para de dizer o que te importa ou não

Sempre tem mais de um culpado quando se cai em tentação
Eu sei.

Se foi pra dizer só isso já pode ir embora
Quer chutar cachorro morto, só que não tá na hora
Ainda tenho caninos, pré-molares e raiva

pra morder sua bunda magra se você não sair agora
Eu vou.

A refeição foi boa pra você?
A carne estava no ponto?
O melhor tempero é a fome

AGORA COME!

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Uma história de superação.

Começo este relato explicando as minhas intenções quando decidi escrevê-lo, muito embora eu saiba que não há porque explicar. Inclusive, os famosos "porquês" têm levado muita gente à ruína emocional e mesmo física, uma vez que nem sempre estamos preparados para encontrar aquilo que procuramos ou, por outro lado, nunca encontrar. Na verdade, quase nunca estamos preparados pra coisa alguma, mas insistimos na busca de sentido pra vida e caímos irremediavelmente na religião, no cientificismo exagerado, na frustração, no desespero e na loucura. Bastam alguns exemplos como Munch, Van Gogh, Bukowski, Chico Mendes, Nietzsche, Cristo, John Lennon, Hitler, Raul Seixas e muitos outros, que sentiam e questionavam demais e se foderam.

O primeiro fato que desestabilizou Van Gogh, por exemplo, foi uma decepção amorosa. E onde ele primeiro buscou abrigo? Na religião. Foi expulso da igreja por tentar defender o povo das injustiças eclesiásticas e governamentais, depois disso começou a encher a cara de absinto e foi pirando assim, sempre em busca de sentido pra tudo e caindo na mais comum armadilha humana. Na verdade, ele caiu em todas elas: buceta, fé e álcool.  Mas a história que pretendo contar é sobre a primeira e a última delas, porque, ao cair em uma, provavelmente cai-se em uma das outras ou mais. Pois bem, vamos ao que interessa.

A última vez que o vi foi na virada de um ano desses para o seguinte e sei que não o verei mais porque sempre que o encontro ele é outro. E ele sou eu.

Eu havia saído de uma festa em um apartamento ali perto da praia de Copacabana e não estava bêbado, pois após tomar duas cervejinhas, o anfitrião me diz na cara de pau que a cerveja está acabando. Corri até a geladeira e peguei outra antes que acabasse e fui embora, deixando pra trás um par de olhos coloridos de verde, azul, ou mel que, ao que tudo indica, seriam meus naquela noite, ou então prefiro pensar assim por tê-la desejado. De qualquer forma, não havia bebida o suficiente e num piscar de olhos eu ganhava a rua onde caminhei por poucos minutos até esbarrar com ele na calçada onde ficam os prédios da orla, que estava menos apinhada de gente do que o famoso calçadão de pedra portuguesa. Ali, podia-se respirar melhor e perceber a loucura que era aquela festança. A alegria transbordava, mas eu sabia que muitos daqueles sorrisos eram de desespero, de pessoas humildes que não tinham conseguido muita coisa no decorrer do ano, no decorrer da vida e punham toda a esperança, que não sei como pode haver tanta, no ano seguinte, mesmo tendo provavelmente as mesmas possibilidades de sucesso. Eu não havia conseguido nada e não esperava nada. Claro, havia os garotões da zona sul com os bolsos cheios e as cabeças vazias e os gringos cheios de tesão nas nossas pretinhas de xota quente e rabo grande. Porra, eu quero fugir dos estereótipos, poderia por ressalvas em cada exemplo desses, mas além de dar trabalho, ficaria entediante, tiraria a fluidez do texto, que parou exatamente no momento em que nos encontramos.

Ele já estava um pouco alterado e trazia uma garrafa de vinho na mão. Abrimos a garrafa e pusemo-nos a conversar dando goles de quando em quando, revezando. De início, pensei em expor a impressão que tive dos tipos que estavam na praia, mas desisti e falamos foi sobre mulher mesmo. A noite não era adequada pra papo intelectual. Deixamo-nos ficar um longo tempo apenas de olhos abertos, como que absorvidos por pensamentos realmente muito importantes e o restante da noite transcorreu na mesma levada, exceto pouco após o estouro dos fogos, quando ele resolveu falar sobre uma tal garota de olhos grandes e vivos que o deixara louco e blá blá blá...achei que fosse mentira ou fantasia de sua cabeça. Subitamente, parou de falar, deu um longo trago no garrafão e disse "é ela. Está vindo". Seu pavor me pareceu honesto.

Acordou com um fio de sol sobre o peito, esperou alguns minutos antes de abrir os olhos como que se preparando pra uma revelação. A cabeça já doía antes mesmo de ver a claridade. Estava em casa? Ainda de olhos fechados tateou o lugar; não era duro nem frio e havia pequenos furos no colchão: Casa. Cauteloso e experiente no que diz respeito a pileques, abriu os olhos bem devagar; aos poucos, o sol cravava alfinetes em suas retinas enquanto abria os braços em uma espreguiçada sofrida. Olhos turvos fitando o teto branco quando sentiu carne na carne do antebraço. Antes de virar pro lado, jurou "nunca mais bebo assim". Depois de tantas noites, seu maior orgulho era jamais ter acordado com uma baranga dentro de casa. Nariz escorrendo, virou enfim para o lado direito e percebeu que ainda estava viva, mas também virada para o lado direito. Tamanho era seu medo que decidiu não descobrir ainda. Foi ao banheiro lavar o ranho branco do nariz e, enquanto isso, ouviu uma voz feminina que dizia bom dia à medida que os braços envolviam-no a cintura. Abriu os olhos de frente pro espelho e de seu ombro esquerdo saía outra cabeça, de hálito quente e olhos negros, lindos...sim, era ela, a deusa inalcançável de quem os românticos tanto falavam, a única garota que jamais conseguiria esquecer, de calcinha e sutiã mordiscando-lhe a nuca.

De volta ao quarto, sentou-se à beira do colchão, serviu-se de um cigarro e quis esbofeteá-la, mas sabia que ela o engoliria tão logo erguesse a mão. Tocou então com gesto aéreo o rosto da cadelinha mas não pôde olhá-la nos olhos e ordenou que a virgem se vestisse para que pudesse imaginá-la, como não deveria ter deixado de ser. Por que não estava lúcido? Agora que ela parecia amá-lo - ao menos havia esboços de sentimento naqueles olhos, naquela ponta de sorriso. Agora que não valia nada.

Queria lembrar de como a danadinha o fuzilou, como o levou pela mão aonde quis que ele fosse. Ele era um cachorrinho sim. A Vênus controlava todo o corpo e mente do moleque que não podia lembrar de como, cambaleante, sustentou a magricela nos braços sem saber que adentrava seu inferno e jogou-a na cama após um beijo com o gosto do brilho labial que ela usava (morango?), arrancando com gesto bruto o sutiã e chupando o seio direito enquanto espremia, incrédulo, o esquerdo. Dessa vez ele se superou. Não lembrava de como aquela penumbra mágica tornara-se nada assim de repente. Nem mesmo memória. Ele queria lembrar daquela noite de relinchos.

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Dois poemas sarcásticos e um outro também

O mundo

Deixa as coisas como estão
tudo dentro da tela da tevê
e nas manchetes
dos jornais

jornais que uso pro meu cachorro mijar

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Ela me elogiou

Ela disse que gostou
do que eu escrevo e disse que
gosta de poemas que falam sobre
abandono. Eu entendi.
- ela era danada de feia -
e me incentivou a não parar.

Eu lembro que não sabia ao certo
pra onde ela olhava e me sentia
desconfortável quanto a isso
mas ela foi gentil comigo
e eu
fui gentil com ela.
Poderia até comê-la.

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O cãozinho

O cachorrinho pediu comida
a "mamãe" dele
deu-lhe um ossinho
ele abocanhou o osso e roeu tudo
no canto da sala

- o sorriso subentendido no ar -